Ele senta do meu lado e eu penso que deveria ter feito as
unhas, porque, assim, de cabeça baixa, restam poucos lugares para ele repousar
os olhos – minha mão e meu aparelho tecnológico cheio de músicas. Toda vez que
o ônibus mexe demais, ele não se importa que meus ombros, tão pesados naquele
dia, encoste nos dele. O cheiro do meu xampu de frutas vermelhas chega aos seus
sentidos por meio dos ventos daquele dia de inverno com sol. Quase pude ver um
sorriso toda vez que inclinava um pouco o rosto e o dele virava, me deixando
como campo de visão uma barba mal feita, que dava vontade de arrumar. Meu quadril,
numa tentativa de se ajeitar no banco pequeno, bate numa mão inquieta. Ele levanta.
Eu ainda permaneço sem conseguir olhá-lo. Mas ele olha. Para trás. Levanto o
olhar, mas não a cabeça. Ele sorri. Desce. Procura meu olhar mesmo de longe. Eu
não olho. Para olhar precisaria olhar para trás. Eu quase nunca olho para
trás.
quinta-feira, 31 de julho de 2014
sexta-feira, 25 de julho de 2014
Sobre sentir: não se desculpem
Se formos viver tudo que aparece
na nossa frente, acabaríamos caindo num vácuo, num vazio sem fim. Por isso
trata-se de escolha. “Escolhi estar com você”. Escolhi... Mesmo não sabendo
como serão as próximas horas, quem dirá o próximo dia, a próxima semana. E não
me peça para dizer que não estou envolvida. Sou humana. Tenho sentimentos. Eu
me envolvo. Depois de alguns beijos e umas noites mal dormidas, porém
aconchegantes. Porque eu sou humana e a impressão que dá é que, por vezes, há
que se pedir desculpa por se envolver. “Desculpa, me perdoa por esse deslize –
me envolvi”. Não façamos isso. Não escondamos tantos nossos sentimentos.
Demonstremos, sim, o quanto estamos interessados! Não confundamos liberdade com
insensibilidade. Ninguém precisa se casar depois de uns beijos, ninguém precisa
se prender – sem querer – depois de alguns encontros. Mas não caiam na tristeza
de viver histórias individuais o bastante para deixá-los, enfim e infelizmente,
menos humanos, menos cheios, menos inspirados. Decidam! Optem pelos caminhos
que te façam transbordar mais amor e alegria e, quando conseguirem isso, tratem
de compartilhar. Relacionar-se tem que ter qualquer coisa disso: de partilha e
de emoção. E de amor, por que não? Amor no sentido mais amplo. Não se prendam a
tantas construções sociais. Falaram, sim, para você, que alguém fica mais
interessado quando você ignora, quando você deixa de correr atrás,
quando você é difícil. Bobeira! Pessoas de verdade – e aqui não consigo fugir
desse clichê mal explicado com um pouquinho de juízo de valor – querem apenas
se elevar. E uma relação tem que trazer isso – mudança. Que dói, melhora, fortifica e, sobretudo, humaniza.
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